O Folio Mais, em Óbidos, dá este ano voz aos povos indígenas, numa edição com curadoria de Candela Varas que criou para o festival literário três novas casas: Escrevivência, Floresta e Fulgor.
Candela Varas, que aceitou o desafio de ser curadora do Folio Mais, capítulo que desde o início do Folio – Festival Literário Internacional de Óbidos esteve nas mãos de José Pinho (1953-2023), mentor do festival, trouxe a esta edição a criação das casas Escrevivência, Floresta e Fulgor.
“Era impossível continuar o legado de José Pinho, era preciso criar outra coisa e o nosso propósito foi criar uma linha curatorial dentro do Folio Mais”, disse a curadora à agência Lusa, assumindo o “interesse em colocar o foco nas literaturas não hegemónicas, não canónicas e, muito importante, narradas através da temporalidade dos afetos e não dos acontecimentos”.
A primeira escritora convidada por Candela Varas foi Conceição Evaristo, autora do conceito de escrevivência, que no sábado lotou a tenda literária para uma conversa em torno do lançamento das suas primeiras obras editadas em Portugal (“Olhos d’Água” e “Canção Para ninar menino grande”, ambos pela editora Orfeu Negro).
A escritora brasileira voltará à tenda dos autores na segunda-feira, para “uma leitura do próximo trabalho inédito dela, com textos eróticos”, e na terça-feira, na Livraria de Santiago, conversa com Verenilde Pereira, pioneira da ficção afro-indígena, “que escreveu um livro há 26 anos, que esteve enterrado até ser descoberto há dois anos” disse Candela Varas, aludindo à obra “Um Rio Sem fim”, que vai ser lançado pela Companhia das Letras.
Na casa Fulgor, Candelas Varas evoca Maria Gabriela Llansol, colocando o foco em conceitos como “o horizontalismo radical e a inexistência de hierarquia entre o humano e não-humano”, para criar uma programação que se cruza com a da casa da Floresta, assente “nos povos originários, em escritores indígenas convidados a partilharem como percebem o mundo”.
Autores do Brasil, Colômbia, México, Panamá e Chile vão participar, no dia 19, numa roda de conversa intitulada “Configurações de Mundos: Encontro Inesperado do Diverso”, no âmbito de um projeto-piloto inspirado na escrita coletiva e desenvolvido em parceria com a Azimuth World Fundacion, a ECO Amazónia e a associação Oceanos.
O Folio Mais leva ainda a Óbidos o escritor mexicano Elvis Guerra e o colombiano Juan Carlos Galiano para participarem em tertúlias de poesia e apresentarem livros ainda não publicados em Portugal.
A julgar pelo afluxo de público às iniciativas já realizadas o balanço da curadoria “está a ser muito positivo”, afirmou Candela Varas, satisfeita com a participação no festival que “não é um lugar narcisista, mas sim um lugar de inquietações de gente que questiona a forma como as coisas podem mexer as construções imaginárias que [as pessoas percorrem] para habitar o mundo de uma forma diferente”.
O Folio – Festival Literário Internacional de Óbidos abriu portas na quinta-feira e decorre na vila até ao próximo dia 20 com mais de 600 iniciativas, distribuídas por várias curadorias, e com a presença de vários escritores e ilustradores internacionais premiados.
O festival é uma organização da Câmara Municipal de Óbidos, da Empresa Municipal Óbidos Criativa, da Fundação Inatel e da Ler Devagar.