A associação cultural Transforma e o município de Torres Vedras estão em litígio quanto ao acordo de colaboração existente desde 2010 e devem seguir para tribunal, explicaram ambos à agência Lusa.
Em 2010, a autarquia e a associação estabeleceram um protocolo para obras de requalificação da sede da associação e a sua afetação à atividade cultural e para a realização do Festival Internacional das Artes, confirmaram ambos à Lusa.
As obras em imóveis adquiridos pela associação no centro histórico da cidade destinados à futura sede integraram o plano de requalificação urbana para aquela zona, com financiamento comunitário.
O projeto de arquitetura de autoria de Pedro Gadanho e da CVDB Arquitetos recebeu o Prémio da Bienal de Arquitetura.
O investimento na aquisição e remodelação dos imóveis custou 1,4 milhões de euros e foi financiado em 80% por fundos comunitários.
No entanto, o projeto acabou por ter um “custo superior ao investimento estimado”, após falência do empreiteiro durante a obra, paragem de um ano e meio e necessidade de lançar novo concurso público, obrigando a associação a avançar com um empréstimo bancário, explicou o presidente da Transforma, Luís Firmo, à Lusa.
Com o aumento dos gastos houve intenções da câmara municipal em reforçar o apoio financeiro à associação, mas a “renegociação do protocolo nunca existiu”, acrescentou.
A sede, cujas obras começaram em 2012, veio a ser inaugurada em 2015 pelo então presidente da câmara, Carlos Miguel, que no final desse ano renunciou ao mandato, sucedendo no cargo Carlos Bernardes (falecido em maio de 2021) e Laura Rodrigues.
Confrontado pela Lusa, o atual executivo municipal, presidido por Laura Rodrigues, alegou desconhecer essas intenções.
A autarquia admitiu que “o investimento global aumentou e algumas despesas do ‘Espaço Transforma’ foram consideradas não elegíveis no financiamento comunitário”, mas esclareceu que se “verificou um aumento da taxa de financiamento de 70% para 80%”, o que cobriu os custos”.
O apoio municipal “deve ser entendido como um estímulo à capacidade de autofinanciamento e mobilização das associações culturais e recreativas em ordem à concretização dos seus projetos autónomos e independentes”, recordou o município.
Por seu lado, o dirigente associativo considerou que a construção da sede foi “uma flor com muitos espinhos que estrangulou a associação” em termos financeiros.
Os alegados problemas financeiros resultaram em incumprimentos junto da banca, Autoridade Tributária e Segurança Social, que levaram a Transforma a despedir funcionários e a interromper a sua atividade cultural um ano após a inauguração da sede.
De acordo com o seu presidente, a Transforma conseguiu liquidar o empréstimo com a ajuda de associados, que agora “precisam de reaver o investimento que fizeram”, escusando-se no entanto a revelar o valor em dívida.
“Desde o primeiro momento em que a associação teve de encerrar a atividade o município foi informado e, desde julho de 2015, a associação encetou conversações com a câmara para comprar o imóvel pelo mesmo valor da dívida, abaixo do valor de mercado”, afirmou Luís Firmo.
Como a câmara não avançou para a compra da sede, a Transforma colocou há um ano o imóvel, avaliado em 1,2 milhões de euros, à venda, pedindo agora 960 mil euros.
O anúncio imobiliário refere que “o conjunto de edifícios, com uma área bruta de 828 metros quadrados e licença de utilização para comércio, serviços e habitação, compreende cinco moradias unifamiliares, sendo duas T1 e três T2 (duas delas, arrendadas), espaço para cafetaria com zona de apoio/confeção, gabinetes e salas de trabalho, três salas polivalentes e uma loja”.
Em dezembro de 2023 chegou a estar agendada escritura pública de constituição do direito de usufruto por 30 anos do espaço pela autarquia.
“O protocolo contemplava apenas o uso dos espaços e não o usufruto, por isso a Transforma se opôs à escritura”, disse o dirigente associativo.
“Como não foi a assegurada a constituição do usufruto, a câmara municipal deliberou proceder à resolução sancionatória do protocolo de colaboração e peticionar a devolução do apoio financeiro concedido para a execução do ‘Espaço Transforma'”, esclareceu o município.
Em setembro último, a autarquia deliberou por maioria revogar o protocolo de 381 mil euros e pedir a restituição de 301 mil euros, por incumprimento da associação ao manter as instalações encerradas e sem qualquer atividade, impedindo a câmara de as utilizar.
“Se não houve necessidade de utilização das salas, nem renegociação do protocolo pelo município, que legitimidade tem o município para pedir a devolução do montante?”, questionou Luís Firmo.
A Transforma foi notificada, mas não devolveu qualquer valor ao município, devendo ambos avançar para tribunal.
A autarquia admitiu acionar o direito legal de preferência na venda do imóvel por este se localizar em área de reabilitação urbana.