Ilustradores científicos portugueses e espanhóis uniram-se numa associação para apoiar profissionais no ativo e em formação e na expectativa de que possa contribuir para o reconhecimento de uma atividade necessária para comunicar ciência.
A associação – Coletivo Ibérico Profissional de Ilustradores Científicos (CIPIC) – começou a ser congeminada em Espanha, mas o primeiro congresso, previsto para setembro, será em Portugal, em Peniche.
O presidente do CIPIC, Pedro Salgado, biólogo marinho, ilustrador e formador na área, espera que a associação recém-criada "contribua significativamente para um maior reconhecimento da atividade e para uma prática profissional equilibrada, digna, de apoio aos ilustradores no ativo e em formação".
"Estamos relativamente bem sintonizados no conhecimento das boas práticas, questões legais, contratuais, orçamentais, mas, sobretudo para os mais novos na profissão, ainda falta uma boa referência de base, com partilha de informação objetiva, validada e apoio a diversos níveis na prática profissional", disse Pedro Salgado à Lusa.
Entre várias ações, o CIPIC propõe-se organizar cursos, palestras e exposições.
A bióloga marinha e ilustradora Cristina Espírito Santo, ex-aluna de Pedro Salgado, considera que em Portugal "ainda há um grande défice" de aceitação da ilustração científica como profissão, apesar de haver "cada vez mais ilustradores".
Segundo a investigadora do Laboratório de Ciências do Mar da Universidade de Évora, em Sines, a ilustração científica, à qual se dedica no tempo livre, "precisa de ser reconhecida e bem paga".
"Muitas vezes não são dados os devidos créditos aos autores e há um uso inadequado da sua propriedade, sem autorização e reconhecimento", afirmou à Lusa.
Para o biólogo marinho Miguel Martins, também ex-formando de Pedro Salgado, quem procura o trabalho de um ilustrador, como ele, muitas vezes não está disposto "a pagar o devido, mesmo que sejam propostos valores não muito longe do salário mínimo".
"Ainda existem muitas pessoas que pensam que é apenas um 'hobby' e que não deve custar assim tanto", queixou-se à Lusa.
Bióloga de formação, mas ilustradora "a tempo inteiro", Luísa Crisóstomo crê que, a longo prazo, "com a contínua divulgação" do trabalho de ilustração científica e com "um esforço conjunto entre ilustradores" será possível "contribuir para uma maior estabilidade profissional".
"Ainda não há uma plena valorização do trabalho e do conhecimento que estão por detrás de uma ilustração científica, desde as horas de pesquisa, observação e estudos preliminares, ao tempo necessário para concretizar um desenho minucioso", sustentou.
Pedro Salgado, que se tem distinguido no desenho de peixes, entende que, apesar das vicissitudes, a ilustração científica em Portugal e no mundo "é uma especialidade que tem todo o futuro", porque "não se faz ciência sem comunicação e não se faz comunicação científica sem imagem".
"Enquanto se fizer ciência haverá sempre lugar para a ilustração científica, que irá acompanhando a evolução científica, como sempre o fez desde o século XVI", assinalou, lamentando que "muitos cientistas não façam o uso que poderiam fazer da imagem, não prevendo à partida nos seus projetos um item para iconografia".
Por outro lado, "quando se trata de trabalhar com o Estado, as regras do jogo burocrático são um gasto excessivo de energia para quem precisa de tempo para ilustrar", acrescentou o biólogo.
Ilustradores científicos portugueses são "relativamente poucos" e conhecem-se "quase todos, pelo menos os que publicam há mais tempo".
Pedro Salgado estima que sejam 70 ou 80, "muitos a trabalhar em paralelo com outras atividades próximas", desde 'design' de comunicação, desenho, pintura, biologia, comunicação, ensino, como é o seu caso.
De acordo com o ilustrador, "o interesse e a formação em ilustração científica têm vindo a crescer".
"Primeiro nos Estados Unidos, desde os anos 70, depois na Europa, em particular Portugal e Espanha, e, sobretudo na última década, em grande parte da América do Sul", enumerou.
Apesar da oscilação de "períodos de maior ou menor atividade", a ilustração científica em Portugal, onde há formação há mais de 30 anos, "está viva", segundo Pedro Salgado.
Um ilustrador científico "pode trabalhar 'online' para qualquer parte do mundo" e, de raiz, a maioria dos profissionais começou por ser um artista ou cientista.
Tem de ter "capacidade de observação e de registo rigoroso, muita concentração e paciência, saber lidar com diferentes temas e técnicas, saber comunicar", resumiu Pedro Salgado, enfatizando que "só é possível ilustrar aquilo que se entende, para depois saber como comunicar com imagem".
Registado em fevereiro em Portugal, o Coletivo Ibérico Profissional de Ilustradores Científicos espera ter este ano "mais de duzentos ou trezentos membros", entre profissionais e estudantes de ilustração científica.
Da comissão instaladora da associação fazem parte 12 ilustradores, entre portugueses e espanhóis.