Terá, no máximo, 50 anos. Angolana sorridente e jovial, voz doce, tem o cabelo esticado e pintado de louro platinado. Na mesa de esplanada cor-de-laranja, olha enternecida, ao fim da tarde, para um miúdo a seu lado sentado. Será filho? Será neto?
Mais à noite, ela juntar-se-á, festiva e com orgulho, aos milhões de anónimos lusófonos a torcer por Ronaldo & Cia, apoiando a Seleção de Portugal de futebol no jogo de má memória, no Estádio da Luz, diante da Sérvia. Como se os intrincados problemas do nosso País se driblassem entre um mero chuto na bola e um golo de júbilo patriótico. Colocar a portugalidade na gaveta de uma baliza.
«Passo cá o final do ano e depois bazo. Cá em Portugal, trabalha-se muito, muito, e não se tem vida para ganharmos uns 600 ou 700 euros. Em Angola ganha-se 3 mil. Aqui é uma miséria. Chega!», começa por afirmar num telefonema emotivo.
E prossegue: «Aqui já não dá! São seis ou sete anos de esperança sem solução. Portugal já deu o que tinha a dar. Tentamos, tentamos, mas já não vale a pena. Gosto muito de Portugal, mas para mim acabou. Passo cá o fim de ano, organizo as coisas com calma e logo vou para aí. Sem tristeza. Sem mágoa. É a vida, fazer o quê?».
A senhora angolana, de óculos escuros em riste, paga agora a conta e leva o miúdo, ar fraternal, pela mão passeio fora. Um vento fresco intimida os resistentes clientes da esplanada de mesas cor-de-laranja. Portugal está em suspenso para saber as escolhas do selecionador Fernando Santos para o (triste) jogo de mais logo. Anoitece no silêncio do subúrbio. Aqui já não dá!